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Mostrando postagens de abril, 2020

Rubi.

Cuidadosa em todos os detalhes. Metódica e pontual. Chegava em casa perto das 17h e acendia um incenso. Tomava banho nos fins de tarde com as luzes apagadas. Se já tivesse anoitecido, acendia velas. Vivia acompanhada de uma caixinha de som branca. Tenho a impressão de que escutava as mesmas músicas. Gostava de dançar sozinha. Deslizava pelos poucos metros do pequeno quarto-sala como se ali houvesse o espaço do mundo inteiro. Não havia. Às vezes se chocava com um móvel ou uma planta. Ria de si mesma e continuava. Era desajeitada nos passos e tinha consciência disso.  Não costumava receber visitas. Passava horas no telefone conversando com alguém que estava longe. Frequentemente desligava o celular, deitava no chão e chorava. Se ligassem novamente, se recompunha em dois tempos. Sorriso no rosto. Sorriso de quem não queria sorrir. Não sei dizer se era saudade. Doía - até de ver doía.  Tinha sempre os lábios vermelhos. Encarava o espelho na parede da sala por horas. Fal...

Miriam.

23:48h. Silêncio total. Girei as chaves com cuidado e entrei em casa. Nenhuma luz acesa. Se minhas preces fossem ouvidas, ela estaria dormindo. Seria mais fácil me justificar pela manhã. Só tive o tempo de abaixar para tirar os sapatos. Ainda sem levantar o rosto, escutei sua respiração. Havia uma silhueta elegante na porta da varanda. Cabelos presos, olhar vazio. O vestido branco pairava calmamente com o vento. Miriam sempre teve uma presença indesvendável que parecia fazê-la levitar. - Reunião de última hora no trabalho. Não tive como telefonar. Foi uma urgência. - anunciei, já imaginando os questionamentos que viriam.  Sem resposta. Não se deu o trabalho de mover um músculo. Era possível sentir sua raiva do outro lado do cômodo. Miriam costumava ser explosiva. Dizia o que pensava até que eu estivesse de joelhos em seus pés. Sempre com requinte. Dessa vez, havia algo diferente. Continuei congelado na porta como quem foi pego em flagrante.  - Você pode perguntar ...