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Adam.

foram exatos dois anos

cinco meses

e vinte e dois longos dias

até que pudesse retornar para casa


em todos os segundos recordei-me do som de sua voz

dos dizeres poéticos

do sotaque etílico

dos dentes desalinhados

das graças que eram intrínsecas a ela


meus lábios lembravam do gosto

meus olhos ansiavam pelos cabelos escuros

meus dedos sabiam o mapa perfeito de sua pele

tudo sobre ela era meu

e eu fui inteiro dela


foram exatos dois anos

cinco meses

e vinte e dois longos dias

até que pudesse retornar para casa


sentado na calçada pensei no que dizer

em como explicar

justificar

inventar

uma forma de dizê-la que nunca quis machucá-la

que ela não tinha culpa de minha iniquidade

que soçobrei ao desespero

que não houve intenção de desgraçá-la 


e mesmo consciente de que nenhum roteiro me salvaria

toquei a campainha com dedos trêmulos

(foram exatos dois anos)

aguardei o que pareceu uma eternidade

e nenhum olhar conhecido me atendeu

(cinco meses)

eis que com um sopro de coragem bato à porta

esmurro a porta

grito à porta

(e vinte e dois longos dias)

e logo vejo uma mulher andando com cautela até a janela

corro até ela com um farfalhar no coração

e a moça me fere com a mais poderosa das lâminas

"adam, ela não mora mais aqui."


e depois de exatos dois anos

cinco meses

e vinte e dois longos dias

descubro que já não tenho uma casa para retornar.

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